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O livro nasceu da minha inquietude com algumas questões: da invisibilidade com que é tratada a criança e adolescente nos litígios conjugais em varas de família, apesar de o discurso ser o de proteção; do lugar de protagonistas da criança e do adolescente nos processos, e a forma como os operadores entendem isso; do equívoco que é feito sobre escuta de crianças, quando se confunde o direito a ter uma oportunidade de ser escutada com o direito de decidir; do excesso de preocupação com a prova da verdade, acabando por gerar excesso de procedimentos, morosidade e violência contra criança, pois o tempo da infância passa rápido e o tempo da Justiça não percebe isso; da falta de instrumentos inibidores do atuar dos pais disfuncionais nos processos de disputa de guarda, que oprimem os filhos e os obriga a escolher um dos lados; dos abusos psicológicos e morais contra os filhos, que ficam à mercê dos pais que demandam à Justiça, que por sua vez entende que não é papel dela decidir algumas questões, e dá aos pais autoridade para decidirem, sendo que eles não estão aptos a decidir, porque estão raivosos, tristes, inseridos na lógica adversarial. Resultado: filhos partidos ao meio e invisibilizados.
O formato do livro surgiu da ideia de que existe um caminho percorrido na Justiça, tanto por parte dos profissionais, como por parte do jurisdicionado. Esse foi o ponto de partida para que cada capítulo tivesse um tema e o seguinte formato: divagação sobre o tema, caminho percorrido enquanto profissional, diálogo entre minhas ideias e a teoria e caso clínico, que ilustra a experiência da criança ou do adolescente envolvido em processo judicial sobre temas diversos.
A leitura é uma trajetória da criança na Justiça, passando pela escuta, pelas avaliações, vivenciando momentos difíceis em que os pais se tornam vingativos e usam os filhos como objeto de vingança, percorrendo outros caminhos de quando ainda há disputa, mas a disputa não é usando o filho como vingança, mas por querer pertencer à história do filho, como são as ações de paternidade socioafetiva. Tratei também do tema dos falsos abusos, das falsas memórias, pela frequência com que aparecem nos processos judiciais envolvendo crianças e adolescentes, onde vemos diariamente pais e mães órfãos de filhos vivos, porque perderam seus filhos, o tempo do processo os afastou definitivamente. O final do caminho é o resgate: é a tentativa de o Poder Judiciário retomar o vínculo afetivo entre pais e filhos, que foi perdido ao longo do processo judicial. E foi esse o primeiro artigo que escrevi, em 2010, quando tratei da Reconstrução de Vínculos Afetivos pelo Poder Judiciário, porque desde sempre acreditei que o caminho da Justiça é o da reconstrução de laços, é o da cura.
A autora.
“Escolhi esse tema a partir da minha inquietude com algumas questões: da invisibilidade com que é tratada a criança nos litígios conjugais em varas de família, apesar de o discurso ser o de proteção; do lugar de protagonistas da criança nos processos e a forma como os operadores entendem isso; do equívoco que é feito sobre escuta de crianças, quando se confunde o direito a ter uma oportunidade de ser escutada com o direito de decidir.
A lógica do direito se baseia na produção da verdade judicial e me preocupa a forma como os operadores entendem a necessidade de se produzir a prova, nem sempre harmonizada com a necessidade da compreensão da criança enquanto um sujeito dentro do cenário jurídico. Muitas vezes, e não raro, as crianças são expostas a procedimentos excessivos, desnecessários, repetitivos, inadequados, conduzidos por técnicos não capacitados em escuta de criança e isso, além de caracterizar violência institucional, é uma perversão da lógica da proteção.
Na prática forense, muitas decisões são tomadas baseadas em premissas equivocadas: a de que a criança sempre fala a verdade, a de que o relato da criança foi colhido de forma adequada, a de que a criança tem autossuficiência para tomar decisão a respeito da própria vida. Para além dos vícios de memória e consentimento que podem invalidar o relato e com isso a prova judicial, existem cuidados que devem ser tomados ao se escutar crianças”.
Glicia Barbosa de Mattos Brazil
Psicóloga do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro; Bacharel em Direito; Especialista em Processo Civil pela Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro e em Recursos Humanos pela PUC RJ; Membro Efetivo do Fórum de Direito de Família e Sucessões da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro; Tutora da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento da Magistratura- ENFAM; Membro do Instituto de Direito Brasileiro de Direito de Família e Sucessões, Coordenadora dos Cursos de Extensão e Aprimoramento em Alienação Parental e de Depoimento Especial de Crianças e Adolescentes da PUC RJ; Professora de Psicologia aplicada ao Direito em cursos de aperfeiçoamento em Escolas Superiores do Ministério Público de diversos estados do país; Professora em cursos de Pós- Graduação da PUC RJ, EMERJ, FEMPERJ, IBDFAM; Entrevistadora Forense capacitada pelo Conselho Nacional de Justiça; Admiradora das coisas simples; Maratonista.
ISBN: 2097
Capa: Brochura